Livros de Literatura e História do Amapá

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domingo, 19 de junho de 2011

ANÁLISE ESTÉTICA DA OBRA “O TREM DE MARIA” DE MAURO GUILHERME

Universidade Vale do Acaraú – UVA / AP
Orientação: Eusébia Santa Rosa
Disciplina: Tópico de Literatura Amapaense – Literatura da Amazônia
Curso: Licenciatura Plena em Letras
Acadêmicos:
Cirlene Baia Pereira
Kelsen Junior dos Santos Correa
Marcela Cristiane Vaz dos Santos
Shirley Kelly Mendonça Paula
William Souza Campos Martins

ANÁLISE ESTÉTICA DA OBRA “O TREM DE MARIA” DE MAURO GUILHERME

1 INTRODUÇÃO

Como a pintura, a arquitetura, a música, a dança, a escultura e tantas outras formas de expressividade, a literatura é uma forma de manifestação artística. O artista recria a realidade e, por isso, é um criador de sonhos e ilusões, segundo suas próprias convicções, seus ideais, suas experiências. Alimentada pela história, a obra produz história, contribuindo para o tempo. Nesse sentido a arte é conteúdo e forma, não dissociados, mas juntos.
Quando se refere à estética da literatura amazônica, quase sempre ela aparece ligada a contemplação da natureza e dos seres. Esse acervo nasce sob o enfoque de referencial histórico. O misticismo e o real imperam, e deixam entrever o que restou às investidas portuguesas relatadas em páginas muitas vezes olhadas com desprezo.
É nas entrelinhas desses textos que encontra-se o relato de um povo que soube resistir e preservar suas peculiaridades, é aqui que se encontra a maneira de ser do homem amazônico que nunca será aniquilada enquanto houver escritores preocupados em manter essas memórias a salvo do esquecimento.
Tendo como suporte o conto “O Trem de Maria” de Mauro Guilherme, compondo o livro homônimo, o presente trabalho apresenta uma visão panorâmica desta obra, mostrando a beleza que há no aspecto criativo intensificado pelo aspecto crítico, marca dos novos escritores que nascem à revelia do naturalismo-realismo.  Abordados de maneira racional sem julgamento quanto à natureza e a forma dessa obra que representa muito bem os meandros daquilo que se convencionou chamar literatura amazônica.

2. OBJETIVOS
2.1 GERAL

Analisar de forma descritiva o modo como o conto “O Trem de Maria” é construído em torno da temática abordada pelo mesmo, dentro do contexto do naturalismo/realismo da literatura amazônica.

2.2  ESPECÍFICO

- Analisar e identificar o gênero literário;
- Interpretar e verificar os vários recursos utilizados na obra;
- Caracterizar a forma condensada do conto;
- Promover a importância de se conhecer a literatura amazônica.

3. REFERÊNCIAL TEÓRICO
O Conto é a mais breve e simples narrativa, centrada num episódio da vida. Mesmo que alguns autores insistam que determinadas narrativas de longa duração sejam também contos por suas características estruturais, pode-se considerar que estes casos estão para confirmar a exceção da regra. Assim, o conto é curto.  E por que é curto, também é conciso. Não há tempo para se espalhar em grandes detalhes, em sutilezas que destoam de seu tempo, de seu necessário ritmo de leitura.  Um conto deve estar contido entre algumas palavras até um máximo de cinco a seis mil palavras.

3.1 CONCEPÇÃO ESTÉTICA

O conto “O Trem de Maria” está inserido num contexto naturalista/realista. Essa concepção estética constitui uma noção fundamental que marcou profundamente toda a arte desde a Grécia Antiga até o final do século XIX. A admiração pela obra de arte, dentro dessa perspectiva, advém da habilidade do artista em fazer a obra parecer ser o eu não é, parecer ser a realidade e não a apresentação.
Dentro da visão naturalista, pode-se distinguir duas concepções: o naturalismo/realista que mostra o mundo como ele é, nem melhor nem pior. E o naturalismo/idealista que mostra o mundo nas suas condições mais favoráveis. Na verdade, mostra o mundo como se deseja que fosse, melhor e aperfeiçoado ao real.
Nessa vertente, o grande representante do naturalismo/realismo amazônico foi Inglês de Sousa (1853-1918). Porém muitos outros brasileiros deixaram-se seduzir pela visão naturalista. Temas como a visão biológica da vida e dos homens, o determinismo como tese de justificativa comportamental, o coletivo, os desvios de conduta, o meio degradado dos vilarejos, das pensões encontraram na literatura vários adeptos.
O certo é que atravessa a Amazônia uma literatura voltada para a descrição dos seres e das coisas da região, servindo como notação referencial histórica e regional. É nesse contexto que se encontrou o Mauro Guilherme.

3.2 BREVE BIOGRAFIA DE MAURO GUILHERME
Escritor Mauro Guilherme

Nasceu em 12 de julho de 1965, em Belém, Estado do Pará, onde se formou em Direito no ano de 1988, mas desde 1991 mora no Estado do Amapá, onde é promotor de justiça. É membro da Associação Amapaense de Escritores e da União Brasileira de Escritores – SP. Autor premiado em vários concursos literários, Mauro Guilherme vem abrindo o seu caminho na prosa desde 2007, quando publicou o romance “Destino”. Em 2008 volta à cena literária com a obra “O Trem de Maria”, o primeiro livro do autor no gênero conto.

3.3 A FUNÇÃO DA OBRA LITERÁRIA “O TREM DE MARIA”

Apresentando a função naturalista, a obra é vista como um espelho que reflete a realidade e remete diretamente a ela. Em outras palavras, a obra “O Trem de Maria” tem a função referencial de transportar o leitor para o mundo dos objetos retratados.

3.4 O TEMPO NA OBRA LITERÁRIA “O TREM DE MARIA”

A obra literária não fica restrita apenas à época e data de sua produção, ela é sempre intemporal porque nela encontra-se parte daquilo que no autor é único e ao mesmo tempo universal.
O conto “O Trem de Maria” apresenta um também um tempo linear e cronológico que remete à memória do passado do protagonista, seguindo quase sempre uma única linha de pensamento.

3.5 ELEMENTOS DA NARRATIVA “O TREM DE MARIA”

Nas narrativas de ficção, percebe-se além do narrador mais três elementos: o enredo; a caracterização dos personagens e o ambiente.
“- Foi ali que aconteceu, meu filho, a história que vou te contar – disse meu tio Carlos, ao iniciar sua narrativa sobre certos fatos que aconteceram na época em que o trem passava na vila de Peixe-boi, no Estado do Pará.” (GUILHERME, 2008, pág. 08)

4. ENREDO DO CONTO

A obra literária “O Trem de Maria”, narrada por Mauro Guilherme é um conto que        retrata a história, a riqueza e os costumes vivenciados pela população conservadora do município de Peixe-boi, no Estado do Pará, na década de quarenta.
Abordando a temática do misticismo, Mauro inicia sua narrativa contando a história de uma jovem sonhadora, cujo maior desejo era viajar de trem, porém jamais teve seu sonho realizado, em virtude do receio de seu pai, que premeditara a desgraça, onde a filha perdia a vida, fato que se concretizou.

4.1 NARRADOR

Na obra literária “O Trem de Maria” o narrador está em 1ª pessoa do singular, participando dos acontecimentos, sendo assim um personagem com dupla função: personagem-narrador. Mas neste conto, ele tem uma participação no enredo, não é a personagem principal.
“Quando meu tio Carlos era jovem apedrejou um trem. [...]” (GUILHERME, 2008, pág. 07)

4.2  CARACTERÍSTICAS DOS PERSONAGENS

MARIA: uma jovem sonhadora, ingênua, contava por volta de 18 anos, morena, de longos cabelos negros, pernas grossas e grandes olhos castanhos;
CARLOS: protagonista no conto tinha vinte anos, amigo íntimo de Maria e nutria por ela um amor inconfessável;
ERNESTO: pai de Maria, era homem severo, machista e supersticioso;
FRANCISCO: telegrafista da companhia férrea, jovem por quem Maria apaixonou-se;
SANTINHA: mãe de Maria, dona de casa resguardada e submissa ao seu marido.

4.3 AMBIENTAÇÃO DO CONTO

Dada a curta extensão do conto, os seus cenários e sua descrição são restritos, reduzidos ao mínimo indispensável para sua contextualização espacial. No caso do conto “O Trem de Maria”, o enredo está ambientado na década de quarenta, no município de Peixe-boi, distante 143 km de Belém, capital do estado do Pará.
“[...] Um lugar sem energia elétrica, telefone, esgoto, água encanada... Gramofone existia [...] O radio já era uma realidade de muitos anos, bem como o telégrafo. Assim que o sol se punha, vinha a noite mais escura do mundo. Para iluminá-la só a lua, milhares de estrelas brilhando e o candeeiro.” (GUILHERME 2008, pág. 07)


4.4 A EXPRESSIVIDADE UTILIZADA

A referida obra literária “O Trem de Maria” apresenta um olhar crítico-social sobre o cotidiano, sem ser nostálgico. Tratando do tema misticismo, Mauro de maneira clara, direta e objetiva, combina percepção, imaginação, carga cultural e histórica para discorrer sobre paixões, instintos e crendices amazônicas.
“- Eu vi o amor de Maria pelo telegrafista nos olhos dela, eu presumi sua gravidez antes de qualquer pessoa e intuí o mau caráter de Chico logo na sua chegada. Eu não teria te chamado aqui, se não soubesse que vais ser escritor.” (GUILHERME, 2008, pág. 14)


4.5 O SENTIMENTO ABORDADO

A frustração pelo amor não correspondido é o sentimento que enaltece a obra de Mauro Guilherme “O Trem de Maria”. É latente a decepção com que o protagonista conta a história de seu amor não confessado.
“Mas tio, por que  o  senhor  não  lhe  confessou  o  seu  amor?  [...]
- Por medo! Medo de que ela se afastasse de mim e nunca mais quisesse ser nem mesmo uma amiga.” (GUILHERME, 2008, pág. 09)

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo como cenário o vilarejo paraense de Peixe-boi, terra do saudoso poeta e jornalista Alcy Araújo (1924-1989), depara-se com vários personagens interessantes, que surgem espontaneamente numa trama bem construída e estruturada, que vai prendendo a atenção do leitor, numa viagem em que as paixões, os instintos, a sabedoria cabocla, a crendice e os costumes amazônicos vão sendo introduzidos paulatinamente, até que se alcance o clímax.
É então que surge uma surpresa agradável: o autor mostra, com talento e sensibilidade, que nem tudo está perdido no ser humano, que ainda resta uma centelha de luz na alma humana, mesmo quando esta imerge na escuridão. E essas reflexões, inseridas sutilmente na narrativa, são fundamentais para que se possa compreender os porquês de tantos acontecimentos e comportamentos envolvendo a obra.
Uma jovem sonhadora, um rapaz apaixonado, um pai obstinado e uma mãe submissa em um ambiente rústico bem ao estilo interiorano, eis os ingredientes desta trama que transcorre em 1943, numa época de grandes transformações no mundo inteiro.
É preocupante se saber que 70% dos brasileiros nunca entraram numa biblioteca e que a média de leitura de livros/ano, por aqui, é de apenas 02 – ou, se quiser ser mais rigorosos, 0,9!
Toda obra é resultado de um projeto único, exclusivo de quem o produziu. Com certeza, o leitor que desejar seguir os meandros deixados por Mauro Guilherme poderá, sem dúvida, estar adentrando no mundo incomensurável dos livros e colaborar para deixar de fazer parte dos números vergonhosos sobre a leitura.

REFERÊNCIAS:
ARANHA, Ana Lucia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993.373 p.
GUILHERME, Mauro. O Trem de Maria. São Paulo: Scortecci, 2008. 98 p.
JORDÃO, Rose; OLIVEIRA, Clenir Bellezi. Linguagens, estrutura e arte: língua, literatura e redação. 2. v. São Paulo: Moderna,1999. 465 p.

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