Livros de Literatura e História do Amapá

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segunda-feira, 20 de junho de 2011

ANÁLISE LITERÁRIA DO CONTO “RAÍZ DE ANO NOVO” DE ELIÚDE VIANA

Universidade Vale do Acaraú – UVA / AP
Orientação: Eusébia Santa Rosa
Disciplina: Tópico de Literatura Amapaense – Literatura da Amazônia
Curso: Licenciatura Plena em Letras
Acadêmicos:
Edilza Pastana de Oliveira
Jeferson Vilhena de Lobato
Líbia Cristina Palheta dos Santos Machado
Noélia Pereira da Cunha
Rayane França Santarém

ANÁLISE LITERÁRIA DO CONTO “RAÍZ DE ANO NOVO” DE ELIÚDE VIANA


INTRODUÇÃO E REFENCIAL TEÓRICO


O conto “Raiz de Ano Novo” é um muito interessante por se tratar da vida, do amor. Sentimentos esses, que muitas vezes para manter as aparências acaba-se por enterrá-los e sem preocupações deixa-se de vivê-los. Simplesmente pelo fato de não querer sofrer com a perda de alguém ou de algo. É isso que a autora aborda a necessidade de enfrentar os problemas de frente e, sem medo, encontrar uma saída, pois, para tudo há uma solução. O que é totalmente inadmissível é viver infeliz como um rótulo, sabendo que é possível mudar.


RAIZ DE ANO-NOVO 

“A vida é crua. Faminta como o bico dos corvos.
E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima.
Oljo d’água, bebida. A vida é líquida.”

(Hilda Hilst)



Caminhando a poucos metros das laterais dos muros baixos, observo nas plantas o viço, fruto do incipiente inverno; o cheiro da terra lavada esfrega-se em minhas narinas. Natal é passado, graças a Chrónos. Avesso à bondade dezembrina dos homens e ao mercantilismo vestido de papai-noel, sou menos um na estatística dos que cultuam esse folclore. Em mim, a melancolia plantada na alma produz sua flor inexplicável. Um jasmineiro enche a tarde de amargura.
Mudará o ano: seis dias faltam para atraves­sar-nos a esperança por dias melhores, a despeito do caos visível. Lembro de nós dois. Do meu desejo de passarmos juntos — e unidos — o fim do ano. O receio de término é um fel no cerne da minha lín­gua. Por mais que eu o cuspa, não logro livrar-me dele. À frente, rodas apressadas transportam metade da poça à saia da senhora a caminho da missa vespertina. O seu susto desperta-me das divagações lamentosas. Deixo o sol de inverno arder-me no rosto e sigo, pisando em falso na estreiteza da perplexidade.
Empurro a porta da sala. Rangem as malcuidadas dobradiças avisando-a de que estou em casa. Ouço um "olá" pálido, saído do escritório. Vejo suas costas aprumadas, imóveis se não chegassem ao braço destro os ziguezagues da caneta. De um lado da escrivaninha, ruma de provas a corrigir, do outro, a garrafa com chocolate — forte e meio amar­go — provavelmente pela metade. O cabelo suspenso por um grampo de metal expõe o pescoço claro, lisinho, como se estivesse à espera de meu toque. Não me aproximo. Seus afazeres de mestra diligente recusar-me-iam, com provas de exaustão, exercícios de des­culpas, como de fato já o fizeram em inúmeras tenta­tivas. O rechaço torna-se-me mais agressivo dado ao seu distanciamento cortês, em nossa relação de oito anos. Uma polidez de unhas perfeitas e afiadas, en­fiadas em meu rosto.
Os móveis negros, revestidos pelo descaso, têm nódoas e pontos mofados. Esgueiro-me pelo espaço da sala, circunscrito a cinco metros quadra­dos ocupados. Tudo muito pequeno e farto de li­vros, de discos antigos e silêncio. Ando farto de tudo. A foto dela sem sorriso, exposta no bar, tam­bém me revela isso. Inversamente aos primeiros anos, quando as aquisições iniciais provocavam-nos comemorações efusivas. O apartamento ficou do jeito que a encantava. Olhava-a com enternecimento, e feliz com sua vivacidade e bom humor — con­trastantes ao meu jeito introspectivo de ser. Na­quela época, absorvido por um sentimento desmesurado, desisti de todos meus casos, antigos e futuros, sob protestos dos amigos. Nem de ami­gos precisei mais.
Em volta, as paredes abafam-me; espalham-me seu escuro, sufocam-me. Pastas empilhadas em cima da mesa, das cadeiras, empurram-me para fora, competem comigo por espaço. Hesito em afastá-las do caminho. São austeras, têm corpos musculosos de papéis. Condenam minha presença e o meu olhar enviesado a elas. No canto, a rede de sisal. Parada. Será o segundo fim de ano sem celebração a dois, sem festa particular. E houve muitas.
Não sei precisar em qual data amarrotou-se a lisura do seu encanto por mim. Ocorrera na época em que ela entupiu as largas horas de folga com aulas extras? Ou quando minhas conversas, sem liames com as suas, desataram no desentendimento? Conseqüências, puras conseqüências.                                         
Evidenciou-se quando o eu, ao procurar carinho, achara sua pele fria, esquiva. Creio que levitava a alma ao menor contato do meu corpo. O que a conduzira à estação dos to­ques repelentes? Suspeitava de qual seria a resposta, por isso nunca lhe perguntara. Casais com mais de cinco anos de teto agarram-se, como caramujos, no limo do companheirismo, nas paredes do patrimônio construído. A muito custo aturam-se, dizem. O amor esmaece a partir do quarto... O desastroso é quando o desamor é unilateral.
Como efeito da maré de desprezo, ancorou-me um barco de despeito e ira. Ao pretender que visse minha importância, ofendia-a desbragadamente e mais agravava a agonia do sentimento moribundo. O revide chegava-me em forma de olhares de repulsa, apatia pelo meu desatino, e abandono da discussão. O mutismo contrastava com seu cantarolar, o chalrar de outrora. As olheiras, acentuadas, se jus­tificariam pela estafa do excessivo trabalho, se não fossem um disfarce para ocultar o incômodo de mi­nha companhia. O lugar que ocupava na cama esta­va invariavelmente frio. Flagelava-se: conservava-se atarefada até alta madrugada, esperando que o sono me vencesse o desejo. Minha insistência fingia não entender que a cama não compartilhada era o seu manifesto ao amor repelido.
A rejeição, gradual, espicaçava meu desespe­ro. Suspeitava de amores clandestinos a exaurirem sua paixão por mim. Quis me vingar. Retornei aos bares, às conversas frugais dos velhos amigos e no­vas amigas. Demorava a voltar do trabalho e, ao retornar, enunciava desculpas inverossímeis, por mais que ela não perguntasse. Deixava souvenir de motéis em lugares óbvios; afastava-me para atender às chamadas telefônicas. Ansiava por uma reação vulcânica. Qual nada.  Tampouco eu discutia. Ques­tionar, para quê? Desconcertante, extremamente desconfortável, seria escutar não gosto mais de ti, tenho-te asco, e ter ásperas verdades friccionadas no rosto.
Esquadrinhando seus papéis, deparei-me com um poema escrito à mão: não serve às paixões imperiosas o sal que entornamos dos olhos quando a ausência tem a mes­ma temporalidade das bolhas de sabão. Primeiro, la­mentei a inata incapacidade poética que jamais me possibilitou, sequer, de preencher um cartão com dizeres originais. Interpretando a mensagem, po­rém, invadiu-me o ciúme cabal, homocêntrico. Atingiu-me o âmago e se propagou às pontas dos dedos. Fiquei impassível. Retirei o papel dentre os demais e o coloquei visível, amparado numa das divisórias da escrivaninha. Quis que ela visse que eu o havia lido. Não o retirou da posição, nem se mani­festou a respeito.
O ruído das folhas e o vai-e-vem da esfero­gráfica são os únicos sinais de vida que me chegam aos ouvidos. Impelido pela nostalgia, vou ao quarto. Agacho-me, encosto-me à parede e as suas ranhu­ras. A tinta deixa-me marcas na camisa, que sairão. O que me mancha por dentro, talvez. A cama, inós­pita, encara-me como a um estranho (ou por que lhe sou bastante conhecido?). Fora nela que eu, tan­tas vezes, desorientado pelas nossas discussões, aba­fava as lágrimas, desmentindo a antinatural — e propalada — aridez dos homens.
A bandeja sobre o criado-mudo, a tesoura de podadura sobre a penteadeira e a filmadora aban­donada no assoalho até denotariam desleixo na ar­rumação se fosse outra mulher que morasse nesta casa. Eu as interpreto como provas declaradas de seu desânimo para com nossa vida. De cima da cômoda apanho a tesoura, comprada para servir ao jardim de inverno, que não vingou. Empunho-a com vigor (estremece-me sabê-la ter o poder de vivificar plantas por meio de talhos profundos). O mal cortado pela raiz penso no adágio. Raiz, semantica­mente, pode significar final e também começo.
Os pensamentos sobem-me efervescentes e energizam meus membros. O fim e o recomeço pe­sam alguns gramas em minhas mãos. Aproximo a tesoura de meu rosto. À frente dos olhos, instanta­neamente, surge-me o escritório. Ela inerte. O pes­coço oferecendo-se à poda. Um golpe azul, lâmina sobre a alvura... A tinta vermelha das correções es­correndo pelos meus dedos. O espírito, dilatado, libertando-me das frustrações dos últimos anos. Minha face estremece ao encosto do metal frio. Arregalo os olhos, desperto. Sobre a cômoda, largo a tesoura e o fardo anoso. Escancaro a janela para o início da noite. O vento, encorpado, que agora car­rega a chuva, instiga-me necessidades verdes, arbó­reas — espaço sem vasos. E sem raízes. Desse esmaecido jardim conjugal preciso, tão-só, de algu­mas mudas de roupas.


GÊNERO DA OBRA


Narrativa curta, sem muitos rodeios e vai direto ao assunto, ao fato. Liga-se ao desejo de contar e ouvir histórias, próprio do ser humano. Histórias do mundo exterior ou da alma humana. No conto “Raiz de Ano Novo”, o narrador personagem volta-se para reflexões de seu relacionamento amoroso “pesando” cada data ao qual levou a um presente de distanciamento, isolamento.


RECURSOS ESTILÍSTICOS


Linguagem introspectiva, sem diálogos.
A rebeldia social, correspondência estética são usados em lugar de adjetivos. São esses; as figuras de linguagem.
O uso de metáforas, linguagem conotativa, ou seja, palavras com significados fora do comum, por exemplo: o cheiro da terra lavada esfrega-se em minhas narinas.
O autor procura estabelecer novas relações significativas com as palavras, a fim de expressar o que sente. Corresponde à linguagem conotativa, e também a base principal da escrita poética. Essa linguagem é muito usada em textos literários, no entanto são usados também em conversas diárias. Desse modo, verifica-se que este recurso lingüístico dar-se-á de maneira comum em diversos textos ou oralidades.
Metáfora é a mudança de sentido de uma palavra a partir do momento em que se estabelece uma relação com outra.


FORMA CONDENSADA DO CONTO


Inovadora, outrossim, faz com que o leitor viaje pelo mundo das obras primas da temática existente. Principais características estão na concisão, na precisão, na densidade, na unidade de efeito ou impressão total, pois causa um efeito singular ao leitor.


ESTRUTURA


Espaço Físico: No apartamento. Especificamente no quarto e escritório.

Tempo Psicológico: É o tempo que transcorre numa ordem determinada pela vontade, pela memória ou pela imaginação do narrador ou personagem. É característico de enredo não linear, ou seja, do enredo em que os acontecimentos estão fora da ordem natural. 

Técnica de Flashback: é um recurso narrativo que consiste em voltar no tempo. Ocorre, por exemplo, quando uma personagem lembra um fato ou conta a outras personagens fatos que acrescentam informações ou esclarecem uma situação, um enigma, etc.


CARACTERIZAÇÃO DOS PERSONAGENS


O Personagem em sua narrativa usa objetos para lembrar-se de acontecimentos, ele vive isolado, distante. Cita a esposa, que também tem desânimo ao viver num casamento sem mais emoções.
“Ele” sente desejo de passar o fim de ano ao lado dela, sabendo que isso não ocorrerá, pela distância que há entre eles. Fala-se de flores, do jardim, onde depositava a última esperança em continuar com ela, no entanto como ele descreve no texto, o jardim não vingou. Então ele desiste dos pensamentos melancólicos e sinistros para com ela e vai embora, deixa-a sem argumentar os motivos pela separação contida ao viverem juntos.
O personagem vive amargurado, tem pensamentos até homicidas.


NARRADOR PERSONAGEM


Narra e conta a história, ele é o sujeito.


TEMÁTICA


           - Folclórica
           - Regional
           - Ambiental


CONCLUSÃO


O conto demonstra toda angústia e o desencanto da autora diante dos acontecimentos que marcam a realidade vivida. E nesse mundo que a autora vive uma sociedade que é pura depuração. Nota-se o pessimismo da autora diante da vida sem encanto, sem amores, sem esperanças, onde a única alternativa pode ser uma receita para anos bons, ou seja, o fim ao recomeço que promete vir cheio de previsões otimistas pra quem tem esperanças de dias melhores.

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